... afinal, como analisa o "25 de Abril" na construção da Autonomia açoriana?

 

Falo apenas por mim: revisitar o passado para melhor entender o presente... a meu ver, a Autonomia açoriana é uma espécia de filha-adoptiva do “25 de Abril”:  estava a pobreza a chorar, junto ao tumulo da riqueza, triste por nao conseguir inspirar  alegria no seio da a tristeza... 
Naquele tempo já era defensor (talvez aspergido pela inspiração poética) duma sociedade civil vacinada contra o colectivismo estatal, e desafecta ao neo-paternalismo social-democrata.  Desde cedo tentei cooperar na desfatalização do ciclone separatista: nunca considerei fascistas os simpatizantes micaelenses do romântico "mapa"…  Para concluir, falta dizer que continuo a ser apologista da esperança em que “amar-o-próximo” jamais seja catalogado como capital tributário… Autonomia açoriana é obra de várias gerações. Não sendo um credo ideológico nem muito menos um troféu partidário, a autonomia é uma promessa de fidelidade açórica à herança luso-atlântica. E, já agora, perante a pertinência deste tipo de interrogação, apetece formular a seguinte pergunta: afinal, quem somos nós? E o que queremos? Primeiro, seria aconselhável separar as pessoas dos problemas: não confundir opiniões com argumentos; sobretudo, considerar a alienação cívico-política como praga silenciosa mas devastadora.
Das figuras políticas que tiveram influência no itinerario da sua vida política (Jaime Gama, Medeiros Ferreira, Angelino Páscoa e outros) quem mais o influenciou na sua modesta caminhada política? 
Boa pergunta... 
Ainda hoje, creio que adquiri o “mestrado emocional” em ideologia política, nas aulas clandestinas da pobreza material que sobrevivia à beira-mar dos calhaus de S.Roque (não estou a falar de miséria moral). Mais tarde, como trabalhador-estudante do Ensino Técnico Profissional, tive a boa-sorte de conviver com vários agentes de ensino, na generalidade gente dotada com rija autonomia intelectual (o escritor Dias de Melo, foi um deles). Já no advento da revolução dos cravos, procurei ser bom aprendiz  da ciência política, graças à proximidade  psico-ideológica com gente muito experimentada na matéria, nomeadamente: Jaime Gama, Mário Mesquita, Medeiros Ferreira, António Arnaut, Angelino Páscoa, Roberto Amaral, Conceição Bettencourt…  tudo isto, sem desprimor em relação às distintas individualidades oriundas doutras origens ideológicas, como, por exemplo, o apreciado ex-presidente regional, dr. Álvaro Monjardino, e os saudosos drs. Melo Alves, Carlos Bettencourt…  Numa breve palavra: o dr. Jaime Gama foi (e continua a ser) a referência nuclear com quem mais aprendi a caminhar nas sinuosidades táctico-políticas do pós-25 de Abril.  Curiosamente, nenhum de nós actuou como funcionário político... 
Naquele tempo, os deputados eleitos (como fora o caso pessoal) antes de aceitarem o desafio parlamentar, já tinham o seu estatuto profissional relativamente consolidado: ausentavam-se em missão de serviço.  A meu ver, algumas das nódoas do sistema democrático são ilustradas pelos ‘fiéis-de-armazém’ da tachada partidária. Todavia, nunca é tarde demais para aperfeiçoar o treino dos candidatos para resistir às múltiplas tentacões facultadas pelo "orgasmo" financeiro. Naquele tempo, obtive acesso ao provérbio chinês, que diz assim: “a dúvida é a sala-de-espera do conhecimento”. Hoje em dia, a generalidade da nova geração parlamentar aparenta possuir melhor preparação académica: dispõe do acesso instantâneo à informática; todavia, em meu modesto entender, notam-se sinais de confusão ético-política entre o arrufo da competência pontual, e o conceito sereno de sabedoria global.
Alguma vez, nesses anos, sentiu que a liberdade poderia estar ameaçada, nos Açores?  
Sim. Ainda hoje, reparo que o lema da ONU – Igualdade, Desenvolvimento e Paz – não parece fazer  boa farinha na nossa comunidade. Pessoalmente, fiquei mais tranquilo após o resultado correctivo do golpe 25 de Novembro/1975. Nessa época, aprendi que uma revolução não é meta de chegada – mas sim linha de partida.  
Sabemos que emigrou para os EUA, no Outono de 1980. Como analisa hoje o relacionamento entre a sua região natal e o país que o acolheu?
Emigrar não foi uma decisão fácil, mas muito necessária. Não seria elegante descrever aqui o barbarismo satânico que a minha família teve de enfrentar. Por agora, repito aquilo que vos afirmei na entrevista concedida em Agosto de 1978: “não serei candidato às proximas eleições da Assembleia da República; todavia, limitar-me-ei em continuar a ser "socialista.” Entretanto emigrei, sem bater com a porta! Durante os 44 anos de experiência imigrante, jamais fui directa ou indirectamente beneficiado  com algum tipo de benefício do Estado Português (ou das mordomias comunitárias lusófonas). Não me considero vítima. Claro que há gente insegura que adora colocar malaguetas escondidas na salada do nosso bom-nome. Felizmente, como trabalhador-imigrante,  tive a boa-sorte de ser bem tratado, mesmo por aqueles mais prudentes que receavam algum eventual contágio dos micróbios ideológicos trazidos na bagagem…!
 
PS - (1961) - "Se andas de cabeca erguida e a verdade tens por lema, transformasta a tua vida num gerenoso Poema") 

 

(*) o autor do texto permanece fiel à antiga grafia.
Rancho Mirage, California