E agora?

                                             

Futebol e politica – duas escaldantes modalidades, bombásticas quando imprevisíveis na sua competitividade do hoje em dia, tantas vezes rotuladas de corruptas porque viciadas em muitas das suas suspeitas dinâmicas e estratégias – aliaram-se, ao mais alto nível, no passado dia 5 de novembro, em ambos os lados do Atlântico, para pregarem duas enormes lições aos supostamente entendidos especialistas nas respetivas matérias, pateticamente esquecidos de que, nos renhidos jogos de futebol, os palpites poucas vezes batem certo e, nas escaldantes eleições politicas, as sondagens valem apenas o que valem. Duas praticamente antecipadas derrotas aos olhos de quem não quis ver ou preferiu ignorar sinais evidentes de que, em jogo aberto, tudo pode acontecer, tornaram-se duas vitórias tão arrasantes quão surpreendentes na expressão clara do seu espantoso desfecho final – um resultado contundente que não deixou qualquer margem para dúvidas nos números expressivos que ficarão para a História, a lembrar os mais arrogantes do tremendo erro que cometem em subestimar adversários porventura menos cotados.
A primeira grande lição veio do campo da bola, quando se defrontaram o todo poderoso Manchester City – equipa de reconhecida classe mundial pelo elevado orçamento que tem e pelo vistoso futebol que pratica sob a credenciada batuta do Mestre Pepe Guardiola – e o nosso modesto Sporting de Portugal, o mais impressionante clube português dos últimos anos pelos resultados obtidos sob a orientação competente do jovem treinador Rubem Amorim que deixou de ser sensação apenas em Portugal para se aventurar, a partir de agora, no comando de um dos mais emblemáticos clubes no mundo do futebol, o outro Manchester (United) com um rico historial que fala bem por si. Por mim, benfiquista do coração (tal como o Mister Amorim), confesso que fiquei agradavelmente surpreendido com a magnifica exibição sportinguista premiada pelo pesado resultado final (4-1) que não deixou margem para dúvidas de quem deu cartas naquela inesquecível “noite europeia” em que ferveram os elogios, a nível nacional e internacional, tanto ao clube como ao treinador. No dizer dum bom amigo meu, foi uma feia tareia que deu que falar e vai continuar a doer.
Os doentes fanáticos da bola, tal como os da política, são uns perfeitos “ceguetas” com extrema dificuldade em verem para além do que querem ver. E o que toda a gente viu nessa inolvidável “noite americana” de votos decisivos do passado dia 5, foi também uma histórica tareia de proporções alarmantes que não vão parar de doer tão cedo a quem perdeu. As dores de que sofre agora o Partido Democrata não são fáceis de curar dum momento para o outro porque foram os próprios democratas a infligirem-nas a si mesmos e isso, sim, dói-lhes ainda muito mais.
De nada serve agora apontarem parvas culpas e desculpas uns contra os outros e tentarem fugir com o cu à seringa da tal dolorosa reflexão que se impõe e lhes obrigue a perceber porque perderam tão claramente. Há muita coisa a correr mal neste grandioso país e querer culpar Trump mais os seus seguidores de serem a causa do óbvio descontentamento da maioria dos eleitores à procura duma animadora mudança de rumo, foi um erro crasso – um tiro que lhes saiu pela culatra, provocando uma derrota sem precedentes. Então, o candidato criminoso que queriam ver na prisão, acabou por ter muitos mais milhões de votos do que a imaculada candidata que nos ia levar à Terra Prometida? Que raio de fiasco eleitoral foi este, com o maltrapilho do perseguido “bandido” a ganhar, “sem espinhas” nem “roubalheiras”, à tão conceituada senhora doutora defensora das leis? Metam a mão na consciência e admitam que falharam redondamente na aposta errada duma estratégia falida.
Pelo contrário – e voltando ao sempre apetecido bate-papo do futebol que nos prende as atenções e escalda as emoções – ninguém duvida hoje que a então arriscada manobra do atual presidente sportinguista em ter ido “roubar” o treinador (Amorim) ao outro Sporting (de Braga), por uma esticada maquia de 10 milhões de euros, foi uma aposta claramente ganhadora. Mais do que o seu brilhante palmarés à frente das hostes leoninas, Ruben Amorim tem no seu cativante carisma um trunfo indispensável para quem aspira a uma carreira de sonhado sucesso além-fronteiras. Claro que o grau de exigência vai ser agora muito maior, pela dimensão global do Manchester United, mas se alguém merece arriscar dar tamanho salto no seu desafiante percurso de treinador, Mister Amorim acho estar perfeitamente qualificado para tão ambiciosa aventura. Leva no seu currículo uma postura elegante de alguém que sabe comunicar e transmitir confiança à sua volta. Uma pessoa que admite, sem quaisquer subterfúgios, ter coração encarnado e exibe o profissionalismo mais a integridade que ele exibiu ao longo de quatro épocas, à frente do eterno rival verde, faz-nos orgulhosos, os que gostamos do desporto-rei praticado dentro e fora das quatro linhas como uma modalidade feita escola de valores com lições que vale a pena aprender. Assim gostasse a política de copiar estes edificantes “exemplos da bola”, que nunca deixará de ser redonda...

Arredondando esta enrolada crónica, resta-me a curiosa rasteira que um bom amigo meu tentou passar-me um dia destes, com a sua manha toda – “e agora que o maluco do Trump voltou à Casa Branca, como é que vai ser para quem não gosta dele?” Discutimos muito em política e em futebol também não puxamos pela mesma cor. Em vez de lhe responder, limitei-me a perguntar-lhe – “e agora... (como é que vai ser para vocês) que o Amorim se foi embora?” E lá olhámos um para o outro encalhados num sorriso maroto subentendendo que o inverno está aí a chegar com seus temidos dias de mau tempo.