A França, a Mulher e as Eleições

 

Terminaram, por agora, as campanhas. No Açores foi a dobrar, depois de 4 de fevereiro. No espaço de um mês, tivemos duas eleições e em junho teremos mais uma para o Parlamento europeu. 
Mas que isto não nos canse – até pelo contrário – porque a alimentação democrática é feita disso mesmo e nós devemos, mais que nunca, participar civicamente no maior ato democrático que é votar.
Simbolicamente, há dois dias - 8 de março – comemoramos o Dia da Mulher. Ela própria uma lutadora pelos direitos de votar, de viver de igual para igual, de usufruir salários iguais por trabalho igual, de não ter de ser vítima e assassinada pelos seus parceiros, de poder viver com a mesma dignidade própria de qualquer ser humano. “A 22 de abril de 1822, na primeira instituição parlamentar portuguesa – Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa – na discussão do artigo da Constituição relativo às eleições dos Deputados, o Deputado Borges de Barros apresenta uma proposta para o direito de voto das mulheres com seis filhos legítimos.
Considera que às mães não se deve negar “o direito de votar naqueles que devem representar a Nação”, pois que ninguém dá mais ao país do que “quem lhe dá os seus cidadãos”. Acusa ainda os homens de manterem propositadamente as mulheres na ignorância, receando a sua superioridade. Borges de Barros afirma que as mulheres não têm qualquer “defeito” que as impeça de exercer os seus direitos políticos e que “não há talentos, ou virtudes em que elas não tenham rivalizado e muitas vezes excedido aos homens”. (Assembleia da República. O voto das mulheres, 1822).”
A proposta de Borges de Barros não foi admitida à discussão pelo Parlamento, de acordo com o que tinha sido defendido pelo Deputado Borges Carneiro:
“Trata-se do exercício de um direito político e deles são as mulheres incapazes. Elas não têm voz nas sociedades políticas: mulier in ecclesia taceat, diz o Apóstolo.”
O voto feminino seria introduzido em Portugal mais de um século depois, a partir de 1931. No entanto, só após a Revolução de 25 de Abril de 1974 se consagraria o sufrágio universal e seriam abolidas as restrições ao direito de voto baseadas no sexo dos cidadãos.”
Olympe de Gouges, uma francesa que ousou tomar a palavra em público, nas ruas, em defesa das liberdades e da revolução que decorria em 1789, foi presa e condenada à guilhotina. Nos últimos minutos de vida disse: “Se a mulher tem o direito de subir ao cadafalso, ela também deve ter o direito de subir à tribuna”.
A revolução venceu. Uma nova Era foi aberta ao mundo: Liberté, Égalité, Fraternité. 
 Como milhares ao longo de todas as Histórias, Olympe de Gouges pagou com a vida, o direito à Liberdade e à Igualdade.  
A França é, a partir de agora, o primeiro país do mundo a incluir o direito da mulher ao aborto na Constituição.
A decisão ocorreu no passado dia 6, numa sessão especial no Palácio de Versalhes, convocada pelo presidente Emmanuel Macron, com os parlamentares das Câmaras alta e baixa. A aprovação alcançou a necessária maioria de pelo menos três quintos dos votos e a Constituição do país de 1958 será revista para consagrar o direito da mulher ao aborto.
"A lei determina as condições de que a mulher tenha a liberdade garantida de recorrer ao aborto" e será inscrita no artigo 34 da Constituição francesa.
Sempre a França na vanguarda dos direitos e liberdades. A maior parte do povo francês apoia a medida para dar proteção extra do direito ao aborto. Uma pesquisa de novembro de 2022 realizada pelo grupo francês IFOP revelou que 86% dos franceses apoiavam a inclusão do texto na Constituição.
Todos estes Direitos e Liberdades nos são concedidos hoje, através do voto livre de todos os cidadãos. Em democracia, nenhum outro ato é tão importante como o de votar livremente.
E a História é a nossa melhor testemunha.